IVO 60 blog

Blog para registros dos processos do IVO60 da Cooperativa Paulista de Teatro.

quinta-feira, 27 de maio de 2010

Ivo60 é 10 - primeira semana

Estou aqui inaugurando o que pretende ser um registro semanal que misture informações objetivas, impressões e questionamentos sobre a construção do novo trabalho do IVO60.
Espero que estes relatos também sirvam para o grupo como referência concreta do caminho percorrido. Eu, como atriz, considero importante revisitar em diferentes momentos o histórico do trabalho para poder aprofundar a consciência de “para onde vamos?”.

Não consigo ser impessoal. Explico. Trabalho a 10 anos na Companhia Auto-Retrato que tem como um dos principais nortes de sua pesquisa o depoimento. Busquei me aproximar do IVO para arejar, nutrir e transformar minhas formas de fazer teatro, construir diálogos e oposições com o meu trabalho de atriz e de atriz que é parte de uma companhia na cidade de São Paulo.
Para minha surpresa, a primeira experimentação cênica (posso chamar assim?) proposta pelo diretor Pedro Granato é a partir justamente de depoimentos pessoais dos atores Ana Flávia, Mariana Leite e Pedro Felício. O foco dos depoimentos gira em torno do que é para cada um deles uma espécie de “fracasso pessoal” e o seu imediato desajuste com a sociedade. Foi simultaneamente com um carinho familiar e com alegria de quem se abre para o novo que me relacionei com os textos e com as tentativas dos atores.

Nesses pequenos Stand ups (já que a proposta é brincar com as linguagens e gêneros da indústria cultural) como se identificar com o depoimento e, ao mesmo tempo, dar o salto para gerar a perplexidade e a surpresa que vêm com o riso da platéia? O eterno jogo cênico de dar e tirar o tapete, provocar o tombo coletivo e retomar depois as rédeas... A brincadeira acontece entre o ator narrativo que é em cena diretor de suas intenções que sabe aonde quer chegar, como formular a piada e, do ator que se deixa revelar na sua fragilidade, que (aparentemente) se perde no fluxo de suas emoções.

Nesses depoimentos as palavras DESORGANIZAÇÂO e DESAJUSTE saltam. Mas desorganização em relação a que? A quem? Não vivemos numa democracia? Essas angústias meio adolescentes são ecos afetados de uma geração ainda influenciada pelo existencialismo de orelha de livro? Afinal de contas, as propagandas de sabonete, conscientes de nossa DIVERSIDADE cultural tão brasileira estão até explorando rostos e tipos nunca antes vistos em nossa televisão (a mulata que não é pobre, a nariguda bonita, a mulher um pouquinho mais fortinha...).
Organização e ajuste são palavras que fazem parte de sociedades mais opressoras e militares... Né?...

Nesse início de percurso, senti uma ausência: a platéia, o telespectador. Quando se imagina a construção de Mahagonny na peça de Brecht, pensa-se em como satisfazer todos os desejos daqueles que passam por lá e podemos fazer muitos paralelos entre esta empreitada e os programas que invadem as casas, experiências que pretendem coloridas sensações. Mas existe também não em oposição, mas como duplo inseparável dessa aparente euforia, o adormecimento, a imagem de que ao sentar a frente do sofá com um controle remoto na mão, o cidadão se “despluga”, se ausenta de sua existência para viver um nada.

Marina Corazza

Nenhum comentário: