IVO 60 blog

Blog para registros dos processos do IVO60 da Cooperativa Paulista de Teatro.

sexta-feira, 20 de fevereiro de 2009

SOMBRAS DA LUZ - eu (não) sou você

Figurinos para a 2ª intervenção - avaliação do processo (dez/2008)

Entre outubro e dezembro de 2008 acompanhamos alguns ensaios e as duas intervenções montadas pelo grupo IVO60 no Parque da Luz. O objetivo geral que nos foi proposto no início do período foi dar início a um processo de experimentação de figurinos adequados à improvisação do grupo e relacionados às necessidades de desenvolvimento de cada ator.

Tendo assistido à primeira intervenção, que ocorreu com o emprego exclusivo de figurinos trazidos pelos próprios atores, observamos a tendência ao acúmulo de objetos bastante desgastados - na maior parte dos casos coloridos - sobrepostos em uma montagem que, em geral, remetia ao universo da loucura, bastante próximo de uma mímese de parte do público local.

Como proposta para a segunda intervenção, decidimos não interferir em pequenos detalhes do processo de construção das personagens pelos atores, mas lançar alguns estímulos em maior escala com os quais as figuras em construção pudessem interagir e criar novas situações com o público, alterando os limites entre o “teatro” e o “não teatro” (ou “realidade”).

Considerando essas diretrizes gerais, a proposta do figurino consistiu em:

- incorporar objetos do cotidiano e da produção do bairro em uma grande colagem, extrapolando o universo da loucura.

- experimentar o limite entre cenografia e figurino, buscando reestruturar o espaço do parque através do estudo das dimensões e das cores.

Essas propostas concretizaram-se, basicamente, em três pontos:

1. Criação de um grande tapete de TNT vermelho com cem metros de comprimento, estendendo-se do portão de entrada ao centro do parque (lateral da Casa de Chá), arrematado por uma máquina de costura sobre uma pequena mesa.

2. Confecção de trinta e cinco camisetas brancas estampadas em dois grupos, com os dizeres: “Eu sou você”, “Eu não sou você” para serem distribuídas como presentes por um Papai Noel (colaborador do grupo) para atores e freqüentadores do parque.

3. Construção de um vestido/ véu, a partir da junção de muitas roupas brancas significativas da produção do Bom Retiro e compradas prontas em lojas de comércio popular da região (o véu foi entregue como presente de Papai Noel para uma das atrizes).

Acreditamos que a experiência em torno desses objetos foi importante no sentido de criar alguns focos de atenção e ação no amplo e movimentado espaço do parque.

Vale lembrar que os elementos distribuídos eram desconhecidos dos atores, adquirindo, portanto, o caráter de estímulos completamente novos para eles tanto quanto para o público, o que reforçou o jogo de domínio do espaço e do público proposto, entre outras coisas, pela diretora. Quando aliados ao improviso dos atores, estes estímulos constituíram-se em meios de intervenção plástica carregados de diversos significados:

- a máquina de costura, um modelo antigo, trazida como uma lembrança da principal atividade de muitos dos freqüentadores do parque – a confecção em larga escala de artigos de vestuário – foi de fato reconhecida enquanto instrumento de trabalho, mas um instrumento um pouco estranho (por ser muito antigo e estar, de certa forma “fora de lugar”, em um parque, a céu aberto, fora da oficina, e, ainda por cima, em uma das extremidades do tapete vermelho, uma espécie de monumento...).

- o tapete vermelho, além de direcionar os olhares para a máquina de costura como um dos “monumentos” do parque (e do bairro), constituiu um novo caminho sobre o caminho habitual. Quem sempre passava apressado por ali, para cruzar o parque, teve de diminuir o passo, e quem estava sentado nos bancos ao longo do caminho, parou para olhar o desenrolar dos acontecimentos: uma dezena de personagens (atores, Papai Noel, freqüentadores crianças e adultos) que tomaram o tapete como “palco”, espaço onde concentraram as suas atividades. O vento também interveio, mudando a forma e a direção do caminho. No fim da intervenção, o tapete transformou-se em uma grande massa de vermelho recolhida com esforço por uma das atrizes (que nele se enrolou, construindo na hora uma disforme roupa-casulo).

- as camisetas, mais um produto da fabricação em série, e a enigmática mensagem nelas estampadas, provocavam um certo estranhamento em quem as vestia e em quem as via, pela questão que elas levantavam – se o ator era espectador, e vice e versa, ou ainda o que diferenciaria ou aproximaria cada pessoa, cada indivíduo, ator ou não.

- o vestido, por sua vez, foi claramente identificado pelo público como um véu, de uma noiva um pouco louca, um acúmulo de peças, de coisas guardadas, de sentimentos.

Nesta peça, experimentamos um princípio que já utilizamos anteriormente e que poderá ser bem explorado no futuro, que é o de um figurino transformável, onde os significados das peças prontas utilizadas na composição somam-se criando um novo e inesperado significado, oferecendo múltiplas escolhas e possibilidades de uso para quem as veste.

Oficina2+

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