IVO 60 blog

Blog para registros dos processos do IVO60 da Cooperativa Paulista de Teatro.

segunda-feira, 14 de junho de 2010

Ivo60 é 10! - Bússola

O IVO60 está a venda!!!
Seus talentosíssimos atores estão a venda!!!
Venha rir de seus dramas patéticos!
Venha se apaixonar por seus corpos sensuais!
A arena está aberta aos leões! E tem música ao vivo!

Você não vai querer ficar por fora desta. Chame toda a família, pegue a pipoca que já vai começar.


Enquanto isso, no camarim...

Walderlei - A gente tá fazendo mais uma peça que tira sarro do melodrama? É só isso? (com ar irônico) É, porque têm poucas em São Paulo, né?

Clóvis - Calma, gente. Pra gente conseguir o que quer tem que estudar sim o melodrama e fazer de verdade. Tô de saco cheio da gente criticar as coisas olhando de cima, inatingíveis. Tem que se enfiar na lama. Quero ver fazer e fazer bem.

Joana (tentando apaziguar os ânimos) - Tá. Mas acho que o que o Wanderlei tá querendo dizer é que parece que não estamos deixando espaço para a crítica. Tipo assim...., a gente de dentro não consegue ver muito aonde isso vai dar.

Camila (transtornada) – E onde nós estamos nisso tudo? Nosso depoimento como artistas, como coletivo teatral na cidade? Sabe, cadê aquela idéia inicial de que eram três artistas que tentavam abrir um espaço e...

Clóvis (nervoso) – A gente não pode começar um trabalho CRI-A-TI-VO sabendo exatamente como e aonde vai chegar. Tem que ter espaço para as surpresas que surgirem no meio do processo. Vamos deixar algumas pontas soltas sim, não é hora de fechar, estamos só no início do trabalho, que saco!

Joana – Calma, Clóvis. É que se perguntar “pra onde vamos” de tempos em tempos é importante. Eu tô me divertindo pra caramba, mas não tô enxergando o norte. Talvez não seja a hora de enxergá-lo com clareza. Mas quero ter certeza de que conforme o trabalho ganha corpo, vamos ter que acertar nossa bússola.

Silêncio.
Entra um músico.


Músico – Alguém viu meu amplificador?


Marina Corazza

Ivo 60 é 10! - Trabalho de voz com Madalena Bernardes

Botar a mão na massa para explorar a voz traz de forma muito palpável a relação (que é tão do ator) entre estar enraizado, apoiado firme e forte sem fazer força, ao mesmo tempo, que brinca com leveza e fluidez.

Depois do encontro, fui à procura do livro “Ser Criativo” do músico Stephen Nachmanovitch. Tenho sempre uma relação conflituosa com este livro porque ao mesmo tempo que parece um livro de auto-ajuda para artistas improvisadores com referências a citações de mestres e gurus chineses ou indianos; traz nas palavras um modo de clarear os diferentes vetores que disputam dentro de nós na geração do ato criativo.

“A pessoa criativa pode ser vista como a incorporação ou a expressão de duas personagens interiores: a musa e o revisor. (...) A musa propõe e o revisor dispõe. O revisor critica, dá forma e organiza o material bruto gerado no livre jogo da musa. Mas se o revisor preceder a musa em vez de segui-la, teremos problemas. Se o artista julga seu trabalho antes que haja algo a julgar, ocorre um bloqueio ou uma paralisia. A musa é criticada antes mesmo de se manifestar. (...)
Assim que brota de sua fonte misteriosa, a obra de arte se torna objetiva, algo que se pode ouvir, avaliar, explorar. Em arte, estamos continuamente julgando nosso trabalho, acompanhando continuamente as configurações que criamos e deixando que nossas críticas realimentem esse contínuo desenvolvimento. A música é auto-controladora e auto-crítica. É assim que criamos arte e não caos. (...)
Mas existem dois tipos de crítica: a construtiva e a obstrutiva. A crítica construtiva ocorre paralelamente no tempo da criação, na forma de um feedback contínuo, uma espécie de trilho paralelo consciente que facilita a ação. A crítica obstrutiva atua perpendicularmente à linha de ação, interpondo-se antes (bloqueio) ou depois (rejeição ou indiferença) da criação. (...)
Isso significa perceber a diferença entre dois tipos de tempo. O contínuo relacionamento entre a crítica construtiva e o trabalho criativo oscila numa velocidade mais rápida que a da luz: ocorre no não-tempo (eternidade). Os dois parceiros, musa e revisor, estão sempre em sincronia, como um par de bailarinos que se conhecem há muito tempo.
Quando a crítica é obstrutiva, e se interpõe perpendicularmente ao fluxo do nosso trabalho em vez de correr paralela a ele, nossa visão de tempo se fragmenta em segmentos, e cada segmento é um possível ponto de parada, uma oportunidade para que a confusão ou a dúvida entrem em cena sorrateiramente. Apreciar ou rejeitar nosso trabalho por mais de um minuto pode ser perigoso.”

“Como músico improvisador, não estou no campo da música, nem da criatividade; estou no campo da entrega. Improvisar é aceitar, a cada respiração, a transitoriedade e a eternidade. Sabemos o que poderá acontecer no dia seguinte ou no minuto seguinte, mas não sabemos o que vai acontecer. Na medida em que nos sentimos seguros do que vai acontecer, trancamos as possibilidades futuras, nos isolamos e nos defendemos contra essas surpresas essenciais. Entregar-se significa cultivar uma atitude de não saber, nutrir-se do mistério contido em cada momento, que é certamente surpreendente, e sempre novo”.

Marina Corazza

quarta-feira, 2 de junho de 2010

Ivo 60 é 10 - segunda semana

Música ao vivo!
Música ao vivo!!!
Música ao vivo!!!!!

Desci para ver os músicos ensaiarem enquanto os atores se aqueciam lá em cima.
A presença da música traz imediatamente a certeza de que o lance é sério. Eles dominam a técnica. As atmosferas se instauram e transitam sem esforço aparente.

Quando a música pára, Mariana me conta que dois deles acabaram de se conhecer. Como assim? Co-mo as-sim?

Sem conseguir não fazer paralelos óbvios, superficiais, e completamente ingênuos, penso em como os músicos são felizes. Eles fluem...
Não inspira confiança a seguinte imagem: numa mesa de bar, o sujeito ao lado começa a falar um texto qualquer de teatro como de Titânia em Sonho de uma Noite de Verão, por exemplo; em seguida a garçonete junto com um grupo de adolescentes começa a entoar o canto das fadas que vem logo depois “Serpes manchadas, feios ouriços/ sapos nojentos, fugi asinha (...)” e assim seguem na noite até o sol raiar...

Porém, não nos causa incredulidade se nesse mesmo bar, alguém puxa um violão, uma rabeca ou uma caixinha de fósforo e o improviso leva a todos.

Não é por acaso que nesse trabalho em que o grupo se debruça especialmente sobre os meios de comunicação de massa, exista a necessidade de a música estar em cena. Ela surge como instrumento poderoso com o potencial de fabricar simulacros de identidade cultural e de gerar o sentimento de que estamos realmente conectados ao próximo, de que somos um só, de que estamos no mesmo barco, de que vamos juntos torcer pelo Brasil na Copa!



A tortura com os depoimentos pessoais continua. Sinto-me muuuito desonesta com os atores por estar invadindo suas privacidades e não estar em pé de igualdade no quesito “deixar a máscara cair”. Agradeço a confiança e peço desculpas ao mesmo tempo. Nunca estive nessa posição, na de quem olha de cima, aprendi a funcionar na horizontal.
Para além do meu incômodo de quem está espiando o que não deveria, não consigo deixar de me remeter a Stanislávski. Existe no trabalho a busca pelo diálogo entre a linguagem do over, do histriônico com o “simples”, com o “pé no chão dizendo olho no olho” (evito as palavras verdadeiro e sincero porque pode-se ser over e sincero ao mesmo tempo. Estou à procura de sugestões para esse termo). Mexer a massa para encontrar esse “simples” ou “essencial” passa por olhar com mais calma para algumas das idéias levantadas por ele. Entre elas, a que me parece mais significativa às dificuldades que surgem, é a da vontade e da contra-vontade. A vontade de ser aceito, de sentir-se amado se opõem à necessidade vital de fazer coisas ou tomar atitudes que imediatamente afastam as pessoas e declaram o fim da ilusão de ser “feliz para sempre”.
Para a piscadinha para a platéia funcionar como um tapa na cara, como a luz que traz a consciência ou como a perplexidade que desnaturaliza os acontecimentos, o mergulho na própria merda tem que ser.

Marina Corazza